Pronunciamento de José Goldemberg na posse do reitor — 25 de janeiro de 2014
Senhor Governador, Magnifico Reitor, colegas, amigos.
USP: 80 anos
Aniversários em geral são ocasiões em que fazemos uma avaliação do ano que passou. O octogésimo aniversário da USP suscita, com mais razão, uma reflexão profunda do que ocorreu nos seus 80 anos de vida.
Este aniversário é ainda mais especial porque assume hoje seu cargo o novo Reitor da USP e a posse de um Reitor só coincide com um decênio do aniversário da criação da USP a cada 20 anos. Só teremos uma outra ocasião como esta em 2034 no centésimo aniversário de fundação da USP.
Decorridos 80 anos a pergunta a fazer é se a USP cumpriu os objetivos para os quais foi criada. Onde acertamos e onde erramos? Em outras palavras, o que há a comemorar?
O que tinham em mente os fundadores da Universidade está no artigo 2º do decreto 6283 de 25 de janeiro de 1934:
- promover pela pesquisa, o progresso da ciência;
- transmitir, pelo ensino, conhecimentos que enriqueçam ou desenvolvam o espirito ou sejam úteis à vida;
- formar especialistas em todos os ramos de cultura, e técnicos e profissionais em todas as profissões de base científica ou artística;
- realizar a obra social de vulgarização das ciências, das letras e das artes, por meio de cursos sintéticos, conferencias, palestras, difusão pelo rádio, filmes científicos e congêneres.
O decreto juntou numa mesma estrutura administrativa diversas instituições de educação superior então existentes e de uma nova Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, “laço de entrosamento científico-cultural” nas palavras de Ernesto de Souza Campos. Na realidade este entrosamento demorou a ocorrer e só foi concretizado com a reforma universitária de 1970 que criou os institutos básicos.
O decreto previu ainda a instituição do regime de tempo integral e da autonomia financeira que só se concretizou em 1988 com a destinação de um percentual fixo do ICMS às universidades do Estado.
No que se refere ao ensino e à promoção da pesquisa não há dúvidas que a USP foi um sucesso. Ela formou até hoje mais de 300 mil graduados que ocuparam e ocupam posições de destaque em todas as áreas da sociedade desde empresas de engenharia até bancos e no próprio Governo. A USP já outorgou também cerca de 45 mil títulos de doutor e seus egressos são parte importante do corpo docente das outras instituições de ensino superior do Estado e do país. Seus docentes publicam, cada ano, cerca de 10 mil trabalhos em revistas científicas. O fato de não ter ainda um premio Nobel entre os seus pesquisadores é apenas uma questão de tempo e de oportunidade. Vários pesquisadores da USP receberam outros prêmios muito significativos e o fato de Mauricio da Rocha e Silva na medicina ou Cesar Lattes na Física não terem recebido o Premio Nobel é uma injustiça.
Existem no mundo cerca de 10 mil universidades e a USP se encontra entre as 200 melhores, isto é, nos 2% onde se encontram as grandes universidades inglesas e americanas. Ela é a melhor universidade da América Latina e está entre as 11 melhores universidades dos países em desenvolvimento, mas pode e deve melhorar estimulando a excelência em todas as áreas. Seus padrões de desempenho e excelência científica e cultural influem nas demais universidades brasileiras.
Contudo, ela não conseguiu melhorar suficientemente o ensino secundário como desejavam Fernando de Azevedo, Julio Mesquita Filho e a Associação Brasileira de Educação e muitos outros que lutaram pela criação da USP. Este é mais um problema do ensino médio em geral do que da USP e que ela não pode resolver sozinha, mas certamente poderia ajudar mais do que tem feito, a meu ver.
Apesar de formar especialistas em todas as áreas os esforços da USP não se refletiram em inovações e aumentos de produtividade na indústria como seria desejável e que ocorreu em outros países da Europa e Estados Unidos. As atividades de pesquisa da USP sempre tiveram uma forte componente cultural. Esta é uma atividade em construção na qual também a FAPESP está engajada, mas que, a meu ver, necessita da adoção de medidas macroeconômicas que estimulem a indústria a se modernizar. A Comissão que o Reitor designou para coordenar as atividades que marcarão os 80 anos da USP se debruçará sobre estes problemas promovendo um debate vivo, inclusive com convidados do Exterior, que nos estimulem a lutar para resolvê-los.