Os caminhos da qualificação do ensino
Três experiências relevantes em busca da melhoria do ensino básico realizadas nos últimos anos em Porto Alegre, em Belo Horizonte e no Ceará são apresentadas no dossiê "Qualidade do Ensino", da edição 60 (maio-agosto/2007) da revista "Estudos Avançados", lançada no dia 10 de setembro.
José Clovis de Azevedo, ex-secretário de Educação de Porto Alegre (1997-2000), analisa a questão da qualidade do ensino na escola pública a partir da experiência daquela capital entre 1989 e 2006. No seu entender, há dois movimentos antagônicos de mudança de rumos na escola pública: um que representa uma reconversão ao mercado e centrado nos valores de competição, produtividade, eficiência, eficácia e avaliação seletiva e classificatória, baseada na mensuração, na quantificação e no produto final; o outro movimento, que pautou as ações em Porto Alegre, orienta-se pela reconversão à cidadania, enfatizando a solidariedade, a cooperação, a autonomia moral e intelectual, a defesa da vida, a emancipação, a humanização e a avaliação com ênfase nos processos, nos tempos e ritmos inerentes ao aluno.
A Escola Plural, projeto adotado na capital mineira a partir de 1994, é o tema do artigo de Glaura Vasques de Miranda, ex-secretária de Educação de Belo Horizonte (1993-1996). Miranda relata algumas polêmicas suscitadas pelo projeto e os resultados da avaliação de seus efeitos. Em sua essência, o projeto buscou instituir na rede pública de Belo Horizonte um tipo de escola mais democrática, mais ampla, mais aberta às diferentes culturas e comunidades.
Sofia Lerche Vieira, ex-secretária de Educação Básica do Ceará, trata da gestão escolar, avaliação e sucesso escolar, a partir das experiências realizadas naquele estado de 1995 a 2006. Vieira enfatiza a importância da "gestão por resultados", uso de indicadores na definição de prioridades e difusão de uma cultura de avaliação no interior do sistema educacional.
As políticas de implantação da organização das atividades escolares em ciclos e as implicações decorrentes disso, como no caso dos processos de avaliação dos alunos, são o tema do artigo de Sandra Zákia Souza, da Faculdade de Educação da USP.
Ladislau Dowbor, professor da PUC-SP e consultor de várias agências das Nações Unidas, discute a importância da vinculação do aprendizado à realidade do local onde a criança vive. Segundo Dowbor, essa vinculação é um investimento poderoso, tanto para tornar o ensino mais produtivo, capitalizando a motivação da criança por entender as coisas que a cercam, como por permitir que mais tarde seja um adulto que conheça o que originou ou as tradições culturais que constituíram a sua cidade, os seus potenciais econômicos, os desafios ambientais, o acerto ou irracionalidade da sua organização territorial, os seus desquilíbrios sociais.
A necessidade do aperfeiçoamento do ensino de ciências nas séries iniciais é a questão abordada por Ernst Hamburger, professor titular aposentado do Instituto de Física da USP e coordenador do programa "ABC na Educação Científica", da Academia Brasileira de Ciências. Para que isso aconteça, ele considera essencial a melhoria na gestão das redes escolares, na formação dos professores, a atualização de currículos e metodologias e a ampliação da divulgação científica via museus e centros de ciência e nos meios de comunicação.
O jornalista Flávio Dieguez colabora com reportagem sobre a situação atual dos professores do ensino básico público da cidade de São Paulo. Dieguez entrevistou professores, diretores e supervisores de escola e alguns dirigentes sindicais da área da educação. As informações foram complementadas por dados produzidas pelo Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), sobretudo em pesquisa que o departamento realizou com o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial de São Paulo (Apeoesp), recentemente divulgada.
Dieguez também apresenta uma proposta inovadora e em fase de consolidação: o Projeto Amorim Lima, desenvolvido na escola de mesmo nome localizada no bairro do Butantã, em São Paulo. Implementado a partir de 1996 por Ana Elisa Siqueira, a proposta trouxe transformações significativas no funcionamento da escola, na participação da comunidade e no envolvimento dos alunos nas atividades escolares.
OUTROS TEXTOS
A edição contém outras quatro seções. Uma delas apresenta a segunda parte do Dossiê "Alimentação e Educação" (a primeira foi publicada na edição 58), com artigos de integrantes do Grupo de Estudos sobre Nutrição e Pobreza do IEA e participantes das oficinas realizados pelo grupo.
Bertolt Brecht é tema de outra seção, que compreende seu texto clássico "O Rádio como Aparato de Comunicação", uma análise sobre esse texto feita por Celso Frederico e artigo de Mark Clark sobre os últimos anos de vida de Brecht, vividos na então República Democrática Alemã, as posturas que adotou nesse período e as críticas que lhe foram feitas.
A seção "Textos" traz artigos sobre Graciliano Ramos, Fernando Sabino, Otto Lara Resende, Hélio Pellegrino, Paulo Mendes Campos, Luiz Gama e Hanna Arendt. A edição é completada por sete resenhas de lançamentos recentes do mercado editorial.