Carlos Américo Pacheco defende a adoção de uma agenda de C&T voltada para a inovação
De acordo com estudos recentes do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), há entre as empresas do País um subgrupo que se destaca pela inovação. São empresas com capacidade de competir nos mercados externos e obter preço prêmio em suas exportações, graças à sua capacidade de introduzir inovações de processo e de produto. Essas empresas pagam melhores salários, empregam mão-de-obra mais qualificada e tem maior presença nos mercados internacionais. Mas constituem exceção no panorama industrial brasileiro.
Os indicadores sobre P&D e atividade inovativa disponíveis são claros quanto ao desempenho ainda insuficiente das empresas brasileiras em termos de inovação, segundo Carlos Américo Pacheco, do Instituto de Economia da Unicamp, que faz no dia 8 de novembro, às 10h, no IEA, a conferência "Uma Nova Agenda de Ciência e Tecnologia para o Brasil”, dentro do Ciclo Temático sobre Inovação Tecnológica. O evento terá como debatedores Claudio Vaz, presidente do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp), e Vahan Agopyan, diretor presidente do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT) e professor da Escola Politécnica da USP.
Pacheco lembra que nos dois últimos levantamentos da Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica (Pintec) do IBGE, menos de um terço das empresas declarou ter inovado nos dois anos anteriores à realização da pesquisa, "um percentual cerca de duas vezes menor do que o apontado em pesquisas similares para a média das empresas dos países desenvolvidos".
O desempenho das empresas é fraco nas inúmeras dimensões da inovação, mas é mais grave na dimensão de produtos novos para o mercado. Segundo Pacheco, isso evidencia que as inovações mais relevantes ocorrem em processos que são inovadores para as empresas, mas já conhecidos pelo mercado: "Prevalecem inovações de processos induzidas pelos fornecedores das próprias empresas".
P&D
O economista ressalta que é especialmente baixo o esforço interno das empresas em pesquisa e desenvolvimento (P&D), com dispêndio e recursos humanos exíguos, o que salienta "a enorme distância que existe entre essas empresas e as empresas líderes no mercado internacional".
Em paralelo à baixa capacidade de inovação das empresas e em parte associada a ela, Pacheco vê uma segunda questão crítica da agenda brasileira: a natureza da estrutura setorial da indústria, "em que é reduzido o peso de setores de maior intensidade tecnológica, qualquer que seja a taxonomia empregada para definir o conteúdo tecnológico da indústria".
Diante de um contexto de forte mudança tecnológica, onde há um peso crescente dos setores vinculados às tecnologias de informação e comunicação, biotecnologia, nanotecnologias etc., o País se depara com desafios que transcendem à melhora da performance inovativa das empresas, diagnostica Pacheco. "É preciso ter clareza sobre como aproveitar as janelas de oportunidades abertas pela mudança técnica e/ou como evitar atrasos maiores decorrentes de estratégias frágeis de adaptação a esses processos de mudança estrutural."
ESTRATÉGIA
Ele defende a adoçao de uma estratégia tecnológica para a indústria que identifique oportunidades e construa uma capacidade industrial em novos setores e, ao mesmo tempo, contemple uma atualização permanente da base técnica, buscando especialmente agregar valor à produção, mesmo em setores tradicionais. Pacheco destaca que "é preciso saber escalar nas diversas cadeias de valor, inclusive em commodities nas quais o país é competitivo, em direção às atividades intensivas em conhecimento e inovação".
Segundo ele, a indústria precisa saber tirar maior proveito dos investimentos que o Estado brasileiro fez na montagem da infra-estrutura acadêmica, que considera "bastante competitiva, mas subutilizada devido às várias limitações mencionadas de baixo esforço de inovação e pesquisa por parte do setor privado".
Pacheco ressalta que o quadro institucional brasileiro (ou ao menos a discussão sobre a dimensão institucional da política do setor) vem se alterando nos últimos anos, com o surgimento de novos modelos de organizações de pesquisa e novas possibilidades de parcerias públicas-privadas, a partir da aprovação da Lei de Inovação. "Mas, na sua essência, esse quadro institucional — herdado nas suas linhas gerais dos anos setenta — é obsoleto e não responde aos requisitos para uma nova política tecnológica." Ele defende maior ênfase na implementação e aplicação das possibilidades legais: "Esses novos instrumentos tiveram pouquíssimas consequências reais e, em razão da falta de experimentação, pouco se sabe acerca de sua eficácia jurídica e econômica e de sua adequação à realidade brasileira".
INTERAÇÕES
Há um consenso amplo da necessidade de estimular e fomentar uma maior interação universidade–empresa e entre empresas, com o objetivo de ampliar a cooperação entre os atores do sistema de inovação, a exemplo do que revelam as melhores práticas internacionais. Entretanto, "há aqui um enorme esforço a ser realizado, em função da fragilidade das interações, da carência de uma cultura de colaboração, ainda que se destaque o ensaio recente de iniciativas públicas de estímulo a essas modalidades de parcerias".
Na avaliação de Pacheco, apesar dos avanços dos últimos anos, com a clara indicação de que inovação é componente fundamental da política industrial e da política de C&T, ainda há muito a fazer para que se dê consistência e concretude às ações públicas e privadas nessa área.
Além da urgência em atribuir-se ênfase e conseqüência às políticas industriais de apoio à inovação e ao desenvolvimento tecnológico das empresas, ele destaca também que é especialmente relevante orientar os recursos disponíveis para o suporte às atividades de P&D e inovação do setor privado, ampliando-se o caráter indutor do gasto público. "Quando comparado com outros países, o gasto público brasileiro em P&D não é baixo, em termos relativos ao PIB. Mas é evidente que esse gasto não é um bom indutor do gasto privado, esse sim muito baixo em relação ao PIB, comparativamente à média internacional."
COORDENAÇÃO
Em sua opinião, a nova agenda da política de CT&I é complexa e de difícil implementação: "Requer uma forte capacidade de coordenação intragovernamental e de articulação de atores; requer, especialmente, uma capacidade de renovação institucional que esbarra na falta de agilidade do governo, em uma série de conflitos de interesses e, especialmente, na falta de clareza de quais são as possibilidades futuras de inserção competitiva do Brasil, em termos das principais atividades econômicas".
Para Pacheco, a política de CT&I deveria ser o corolário de uma estratégia de transformação produtiva, que fizesse frente às rápidas mudanças internacionais (a emergência da China como grande centro de manufatura mundial e a evolução da fronteira tecnológica). "Temos uma grande dificuldade de vislumbrar qual é essa estratégia, quanto mais de alinharmos uma agenda de política coerente com essa estratégia."
PERFIL
Professor do Instituto de Economia da Unicamp, onde tornou-se mestre e doutor em economia, Pacheco fez pós-doutorado na mesma área na Universidade Columbia (EUA). Graduou-se em engenharia elétrica no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). É consultor especial do Sistema de Parques Tecnológicos do Estado de São Paulo. Foi secretário executivo do Ministério da Ciência e Tecnologia e coordenador do Núcleo de Economia Social, Urbana e Regional da Unicamp. Produziu mais de 50 trabalhos, entre artigos publicados em revistas especializadas, livros, capítulos de livros, relatórios técnicos e de pesquisa. Suas linhas de pesquisa são: dinâmica econômica regional; desenvolvimento tecnológico; competitividade industrial; e demografia e urbanização.
Foto: Unicamp