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Cátedra Unesco para a Sustentabilidade do Oceano divulga relatório sobre o patrimônio marinho-costeiro do Brasil

por Matheus Nistal - publicado 06/12/2023 15:50 - última modificação 06/12/2023 16:08

Levantamento mostra a importância do mar para a economia, a regulação climática e o bem-estar da população brasileira

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Sumário para Tomadores de Decisão

O Sumário para Tomadores de Decisão, avaliação prévia que reúne os principais resultados do “1º Diagnóstico Brasileiro Marinho-Costeiro sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos”, foi lançado no dia 23 de novembro pela Cátedra Unesco para a Sustentabilidade do Oceano e pela Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES). O levantamento sobre a biodiversidade marinha-costeira e os seus serviços ecossistêmicos pretende contribuir para “tirar o Oceano da invisibilidade”, segundo os organizadores.

O documento, que aponta a degradação do Oceano, reúne informações objetivas e contundentes que demonstram o papel vital do patrimônio marinho-costeiro para o bem-estar humano, a geração de riqueza e a sociodiversidade nacional. O texto contribui para o melhor conhecimento dos benefícios e desafios da conservação marinha-costeira no país, revelando a importância desse ambiente para além de uma visão puramente econômica e da dimensão estética e espiritual.

Dirigido a lideranças, gestores e também ao cidadão comum, o levantamento tem o intuito de ressaltar a influência do Oceano no dia a dia da população brasileira e apoiar a tomada de decisão individual e coletiva embasando a proposição de novas atitudes, ações, instrumentos de gestão e políticas públicas em prol da zona marinha- costeira.

O Sumário traz as mensagens-chave e os resultados consolidados no Diagnóstico, elaborado por 53 especialistas acadêmicos e governamentais, 12 jovens pesquisadores e 26 representantes de povos indígenas e populações tradicionais do Brasil, em diálogo com atores do poder público e da sociedade civil.

A Amazônia Azul – como é chamada a área marinha brasileira com 5,7 milhões de km² – equivale a dois terços do território continental e abriga alta biodiversidade em uma grande variedade de habitats. As atividades econômicas relacionadas ao Oceano e regiões costeiras respondem por 20% do PIB nacional e abrangem distintos setores – pesca, aquicultura, navegação, mineração e turismo são alguns exemplos –, o que denota seu potencial para gerar riquezas e desenvolvimento.

Ao chamar a atenção para a deterioração do Oceano o estudo evidencia para o público, seja ele morador ou não do litoral, a relação de interdependência do ser humano com esse ambiente. Segundo Beatrice Padovani, professora de Oceanografia da Universidade Federal de Pernambuco e uma das coordenadoras do Diagnóstico, “milhões de pessoas vivem e tiram seu sustento do Oceano e da zona costeira, daí a importância de fazermos boas escolhas e a hora de agir é agora”.

Alexander Turra, professor da Cátedra Unesco para a Sustentabilidade do Oceano na Universidade de São Paulo e um dos coordenadores do Diagnóstico, alerta para o fato da atividade humana acabar comprometendo a capacidade do Oceano em contribuir com a sociedade. “A tendência de perda da biodiversidade e dos benefícios providos pela natureza é alarmante, mas temos todos os elementos para reverter esse cenário”.

Ameaças

O Diagnóstico mostra que as alterações na zona marinha-costeira são diversas e complexas, com efeitos sinérgicos e cumulativos entrelaçados a políticas públicas e atividades humanas. Entre as principais causas da perda da biodiversidade: ocupação desordenada e mudanças no uso do solo que danificam e suprimem áreas naturais, ocasionando estreitamento da costa e perda de habitat de inúmeras espécies; poluição ; sobre-exploração de recursos e má gestão da pesca ; introdução de espécies exóticas invasoras; e as mudanças climáticas.

Além de explanar a magnitude do problema e evocar o senso de urgência, o documento apresenta oportunidades para a promoção de um Oceano próspero, efetivamente protegido e usado de forma mais justa, equitativa e ambientalmente sustentável. Cristiana Seixas, pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais da Universidade Estadual de Campinas e também uma das coordenadoras do Diagnóstico, acredita que é possível frear a degradação e, em algumas partes, até revertê-la por meio de uma ação rápida e articulada em todas as esferas e níveis.

Governança

O estudo tem como intenção colaborar para um processo de governança que permita a elaboração e, principalmente, a implementação de políticas públicas coesas, coordenadas em nível federal e articuladas com estados e municípios.

A boa governança do Oceano e do litoral é multinível e multissetorial. “Depende do engajamento e da corresponsabilidade de diversos atores sociais que atuam em diferentes níveis da organização sociopolítica do país. Diversidade de setores, etnias, gêneros e de gerações são elementos importantes”, diz o texto.

Seixas explica que, para passar de um arcabouço fragmentado a uma governança integrada, é necessário que haja mudanças estruturais tanto políticas como institucionais: “precisamos deixar o pensamento reducionista e setorizado e incutir a lógica sistêmica na mente de todos os tomadores de decisão”.

Cultura oceânica

O estudo endossa a promoção do conceito da Cultura Oceânica, que é um movimento mundial que busca disseminar a influência do Oceano na vida das pessoas e o impacto da ação humana sobre ele, incentivando a troca de conhecimentos e a reconexão com o mar.

Segundo o documento, “tal movimento criará uma sociedade engajada capaz de qualificar a forma como o Brasil construirá o Oceano do futuro, fortalecendo seus ativos para o desenvolvimento socioeconômico sustentável do país”. Os coordenadores indicam a necessidade da democratização do acesso a essa agenda, o que passa pela inserção do tema em distintos canais, em especial escolas e meios de comunicação. “É preciso fazer parcerias com o setor público, o privado e o terceiro setor para utilizar todos os canais possíveis, investindo em marketing ambiental para sensibilização através das artes, e em iniciativas de formação principalmente para os jovens”, recomenda Seixas.

Empresas como aliadas

Apostando na enorme capacidade da iniciativa privada de acelerar mudanças e mobilizar o debate, o Diagnóstico enfatiza o papel crucial desse setor na integração entre desenvolvimento e conservação, a partir de investimentos em ciência e ações sustentáveis. Mas, na percepção dos autores, boa parte do empresariado brasileiro vê o oceano de forma limitada e pragmática – acima de tudo como fonte de recursos – e considera a conservação como obstáculo ao desenvolvimento.

“O setor privado ainda não despertou para a importância do tema como elemento central de políticas internas de sustentabilidade”, afirma Turra. Padovani conta que isso vem mudando no cenário internacional, onde já desponta uma visão da conservação como parte do negócio e não um preço a se pagar por fora. “Precisamos construir essa compreensão de que os bens e serviços da natureza, dos quais dependemos, por sua vez dependem da manutenção de uma rede de funcionamento natural e autorregulada”, argumenta.

Mudanças climáticas

O Diagnóstico reitera a relação intrínseca entre Oceano e clima. Se, por um lado, o Oceano e a zona costeira atuam como amortecedores contra as mudanças climáticas – sequestrando e estocando carbono e atenuando eventos extremos –, por outro as alterações do clima contribuem para a elevação do nível médio do mar, com ressacas de maior alcance, acidificação e aumento da temperatura da água causando impactos sobre a biodiversidade, os serviços ecossistêmicos e o bem-estar humano.

Os pesquisadores afirmam que os esforços contra as mudanças climáticas ainda não levam em consideração a saúde dos oceanos. “Certamente o tema Oceano deveria ter mais visibilidade dado sua importância”, desabafa Seixas.

Conhecimentos indígenas e tradicionais

O estudo enaltece a complementaridade dos diferentes saberes e salienta que um Oceano sustentável depende da aplicação dos sistemas de conhecimento científico e tradicionais. “Em meio à crise ambiental mundial percebemos que nossa civilização está errando em vários aspectos. Nós perdemos o contato com o mundo natural e precisamos reaprender o respeito à natureza com aqueles que ainda detêm essa sabedoria em sua cultura e em suas práticas. Povos indígenas e comunidades tradicionais são direta e imediatamente afetados por impactos de degradação ambiental e por isso fazem parte da solução”, alerta Padovani.

Com informações da assessoria de imprensa da BPBES