Dennis de Oliveira analisa coletivos culturais periféricos da cidade de São Paulo
Baseados principalmente em vínculos comunitários e experiências de resistência política às opressões sociais que ocorrem nas periferias, os coletivos culturais periféricos "reinventam formas de organização produtiva, constituindo arranjos locais a partir de outras lógicas, distintas do paradigma produtivo neoliberal", segundo o professor Dennis de Oliveira, do Departamento de Jornalismo e Editora da Escola de Comunicação e Artes (ECA) da USP, participante do Programa Ano Sabático do IEA em 2019.
De julho a dezembro, ele desenvolve no Instituto o projeto "Periferias Insurgentes: Os Coletivos de Cultura e Comunicação nas Periferias da Cidade de São Paulo", no qual fará um mapeamento da atuação desses coletivos e analisará três aspectos:
- as experiências dos coletivos em relação ao papel dos processos comunicativos como eixos norteadores das suas perspectivas de organização;
- os processos de ressignificação dos territórios periféricos a partir da ação dos coletivos;
- as relações institucionais mantidas pelos coletivos com organismos governamentais, empresas, universidades e outras instituições.
Perfil Com formação acadêmica pela Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP da graduação em jornalismo à livre-docência em jornalismo, informação e sociedades, Dennis de Oliveira ingressou como docente no Departamento de Jornalismo e Editora da ECA em 2003, tendo sido diretor do departamento de 2014 a 2018 . Além de lecionar na graduação em jornalismo, também é docente e orientador do Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina (Prolam) da ECA-USP e do Programa de Pós-Graduação em Mudança Social e Participação Política da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (Each) da USP. Na USP, é também coordenador científico do Núcleo de Apoio à Pesquisa Centro de Estudos Latino-Americanos sobre Cultura e Comunicação (Celacc). Foi docente e orientador na área de Direitos Humanos do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Direito (FD) da USP. Oliveira lecionou também na Universidade Metodista de Piracicaba, Universidade de Mogi das Cruzes, Universidade Anhembi Morumbi, Faculdade de Valinhos e no Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos (Cebela). Ele é autor de três livros, 15 capítulos de livros e 25 artigos em periódicos científicos. |
Para ele, os coletivos culturais periféricos se constituem em uma forma de organização que expressa uma crítica ao modelo dominante e potencializa propostas de outras sociabilidades." Suas motivações, organização e realizações compõem o que é chamado de "cultura popular potencialmente contra-hegemônica, principalmente porque reposiciona e dá visibilidade a sujeitos historicamente apartados da esfera pública política", afirma Oliveira.
A delimitação do universo de estudo aos coletivos financiados por programas de fomento governamentais deve-se ao interesse de Oliveira em investigar as tensões, conflitos e negociações que ocorrem no processo de relacionamento entre as experiências organizativas dos coletivos e as estruturais institucionais do Estado.
"Entendemos que as potencialidades expressas nessas experiencias não são isentas de conflitos permanentes, de mecanismos de cooptação e resistência."
No que se refere ao impacto local dos coletivos, os territórios onde estão inseridos são ressignificados, "deixando de ser apenas lugares com carências e transformando-se em locus de potências, dando voz aos sujeitos desses territórios e dando visibilidade às suas ações", afirma Oliveira.
Quanto ao papel os processos comunicativos como norteadores da organização dos coletivos, ele explica que isso se deve ao fato de a organização ser baseada nos fluxos de informação e comunicação, "recuperando a experiencia histórica de redes sociais (que é diferente de plataformas de redes) existentes nas tradições das culturas populares". A apropriação das tecnologias das plataformas de redes sociais existentes atualmente potencializa essa experiencia organizativa, de acordo com o pesquisador.
Em relação à inserção de artistas e produtores dos coletivos no mercado cultural predominante na sociedade, Oliveira trabalha com a hipótese de que essa inserção é produto de tensionamento de significação, "pois o mercado cultural predominante tem um lógica e objetivos distintos dos sentidos dados pelas práticas culturais periféricas".
"Há que se observar como essa inserção mantém ou esvazia sentidos de cada uma das estruturas, lembrando sempre que a concepção de cultura do mercado é hegemônica. Para tanto, temos reconstruído o conceito de 'transformismo' de Gramsci, quando o pensador italiano tratava de cooptações de lideranças operarias dentro do aparelho de Estado."
Mas, à medida que a cultura hegemônica se realiza dentro da indústria cultural, até que ponto a inserção de artistas e produtores dos coletivos neste mercado cultural hegemônico não aponta para um "transformismo cultural"? Oliveira responde que não possui a priori uma posição fechada sobre isso, dado o dinamismo dos processos culturais, "mais complexos que as estruturas institucionais do Estado stricto-sensu", que foram a base da construção deste conceito em Gramsci". Ele pretende desenvolver essa questão na pesquisa.
Foto: "Jornal da USP"