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Encontro reúne cátedras da USP para estabelecer rede colaborativa

por Mauro Bellesa - publicado 17/10/2023 11:55 - última modificação 24/10/2023 11:21

1º Encontro Intercátedras da USP foi realizado no dia 3 de outubro. O evento foi organizado pelo IEA e pela Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação.

1º Encontro Intercátedras - 2023
Participaram da reunião representantes de 14 das 23 cátedras existentes na USP

Originária da apropriação da cadeira do bispo na universidade medieval autônoma, a cátedra passou por várias transformações ao longo dos séculos e perdura em várias universidades estrangeiras como posto de pesquisa, caso da Cátedra Lucasiana, criada em 1663 na Universidade de Cambridge, Reino Unido, e ocupada durante 33 anos por Isaac Newton e 30 anos por Stephen Hawking.

Em novembro de 1968, uma lei federal determinou o fim das cátedras no ensino superior brasileiro. No antigo sistema, o titular da cátedra era a autoridade suprema e vitalícia de uma disciplina na universidade. Em seu lugar surgiu a organização dos docentes em departamentos, onde vários professores podem estar no mesmo patamar da carreira simultaneamente.

A partir dos anos 90, começaram a surgir, no IEA, novos tipos de cátedras na USP, dedicadas a diferentes temáticas e com estrutura e funcionamento específicos. O Instituto sedia sete cátedras em parcerias com diferentes organizações públicas e privadas, além de participar de uma rede franco-brasileira de cátedras com as universidades estaduais paulistas.

Cátedras participantes
e seus representantes

Cátedra Unesco de Direito à Educação

  • Vinculada à Faculdade de Direito (FD)
  • Criada em 2007
  • Representante: Nina Ranieri (coordenadora), professora da FD

Cátedra José Bonifácio

  • Vinculada ao Centro Ibero-Americano (Ciba) da Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação (PRPI) e ao Instituto de Relações Internacionais (IRI)
  • Criada em 2013
  • Representantes: Gerson Damiani, do Ciba e da Escola Politécnica (EP); Ana Paula Castelhano (pesquisadora)

Cátedra Luiz Olavo Batista de Estudos da Paz e Resolução de Conflitos

Cátedra Oswaldo Aranha

  • Vinculada ao IRI
  • Criada em 2023
  • Representantes: Leandro Piquet, professor do IRI; Adriano Rosa, doutorando do IRI

Cátedra Alfredo Bosi de Educação Básica

  • Convênio entre a USP, o Itaú Social e a Fundação de Apoio à Universidade de São Paulo (Fusp)
  • Vinculada ao IEA
  • Criada em 2019
  • Titular e representante: Naomar de Almeida Filho, professor visitante do IEA
    Outros representantes: Luís Carlos de Menezes (coordenador acadêmico), professor do Instituto de Física (IF); Lino de  Macedo (coordenador adjunto), professor do Instituto de Psicologia (IP); Bernardete Gatti (integrante do Comitê Consultivo), pesquisadora da Fundação Carlos Chagas; Luiz Roberto Alves (integrante), professor sênior da Escola de Comunicações e Artes (ECA) e integrante da Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino (Sasi) do Ministério da Educação

Cátedra Erney Plessmann de Camargo

  • Vinculada à Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação (PRPI)
  • Criada em 2023
  • Representante: Ana Paula Tavares Magalhães, professora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e assessora da PRPI

Cátedra Unesco para Sustentabilidade do Oceano

  • Convênio entre a USP e a Unesco
  • Vinculada ao IEA e ao Instituto Oceanográfico (IO)
  • Criada em 2019
  • Representantes: Aleksander Turra (coordenador), professor do IO; Luciana Xavier (integrante), pós-doutoranda do IO

Cátedra Olavo Setubal de Arte, Cultura e Ciência

  • Convênio entre a USP e o Itaú Cultural
  • Vinculada ao IEA
  • Criada em 2015
  • Titular: Conceição Evaristo (escritora e educadora)
  • Representantes: Martin Grossmann (coordenador acadêmico), professor da ECA;  Liliana Sousa e Silva (coordenadora executiva)

Cátedra Jayme Cortesão

  • Convênio entre a USP e o Instituto Camões
  • Vinculada à Departamento de História e ao Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da FFLCH (anteriormente vinculada ao IEA)
  • Criada em 1991
  • Representantes: Vera Ferlini (coordenadora), professora da FFLCH;  Luiz Otavio Tasso (pesquisador)

Cátedra de Estudos Irlandeses W.B Yeats

  • Convênio entre a USP e a Embaixada da Irlanda
  • Vinculada à FFLCH
  • Criada em 2009
  • Representante: Laura Izarra (coordenadora), professora da FFLCH

Cátedra Instituto Ayrton Senna

  • Convênio entre a USP e o Instituto Ayrton Senna
  • Vinculada ao Polo Ribeirão Preto do IEA
  • Criada em 2023
  • Titular e representante: Maria Helena Guimarães de Castro, ex-presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE)

Cátedra Sérgio Henrique Ferreira

  • Convênio entre a USP e o Santander Universidades
  • Vinculada ao Polo Ribeirão Preto do IEA
  • Criada em 2019
  • Titular: Mozart Neves Ramos, ex-reitor da UFPE
  • Representante: Carla Ventura, coordenadora do Polo Ribeirão Preto e professora da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (Earp)

Cátedra Luiz de Queiroz

  • Vinculada à Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz
  • Criada em 2017
  • Titular: Evaldo Ferreira Vilela, ex-presidente do CNPq
  • Representante: Luiz Reinaldo Aleoni, professor da Esalq (representando a diretora da escola, Thais Vieira)

Cátedra Otavio Frias Filho de Estudos em Comunicação, Democracia e Diversidade

Cátedra Martius Alemanha-Brasil de Humanidades e Sustentabilidade

  • Convênio entre a USP e o Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico (Daad, na sigla em alemão)
  • Vinculada à FFLCH
  • Criada em 2001 (vinculada ao IEA até 2006)
  • Titular e representante: Laura Kemmer, pesquisadora de estudos urbanos

Organização

A Comissão Organizadora do encontro foi constituída por Ana Paula Tavares Magalhães, Guilherme Ary Plonski, Laura Patrícia Zuntini de Izarra, Naomar de Almeida Filho, Paulo Vitor Almeida e Rafael Borsanelli.

O IEA estimula a realização de atividades conjuntas entre suas cátedras e aspira à interação com as outras cátedras da Universidade. A Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação (PRPI) também possui cátedras a ela vinculadas e deseja que as várias cátedras da USP se articulem em projetos conjuntos, quando da confluência de interesses.

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Notícia

Foi para promover essa dinâmica que o IEA e a PRPI realizaram, no dia 3 de outubro, o 1º Encontro Intercátedras da USP. Nele, na parte aberta ao público (manhã), foram apresentados os resultados preliminares de um levantamento já respondido por boa parte das cátedras existentes e uma exposição sobre seu papel na academia na atualidade.

Também durante a manhã, os representantes das cátedras e o público (presencial e online) foram brindados com uma aula detalhada sobre a origem das antigas cátedras nas universidades medievais e como elas se transformaram ao longo dos séculos [a partir de 1h27min do vídeo do encontro]. Os expositores foram Naomar de Almeida Filho, ex-reitor da UFBA e da UFSB e titular da Cátedra Alfredo Bosi de Educação Básica e Ana Paula Tavares Magalhães, assessora da PRPI e coordenadora do Grupo de Pesquisa Investigações sobre a Pluralidade e Ambiguidades Relativas à Condição Humana do IEA.

No período da tarde, o encontro foi restrito aos representantes das cátedras, para a discussão de temas como formas de governança, interação com o ensino, a pesquisa e a extensão da Universidade, possíveis modelos de financiamento e a conexão com a realidade latino-americana.  Além disso, foram discutidas as etapas para uma interação continua do grupo, inclusive propostas de publicações e estratégias para atuação em rede.

O encontro integrou a programação do projeto USP Pensa Brasil 2023, idealizado pela vice-reitora, Maria Arminda do Nascimento Arruda, para reiterar o compromisso público da Universidade com a reflexão sobre os grandes temas contemporâneos, reforçando seu papel na "produção de conhecimento científico, na formação cidadã e na defesa de um projeto democrático e justo de país."

Paulo Almeida - Intercátedras
Paulo Almeida apresentou resultados iniciais de primeiro levantamento sobre as cátedras da USP

De acordo com o diretor do IEA, Guilherme Ary Plonski, há algum tempo havia o desejo de o Instituto organizar um encontro de todas as cátedras da Universidade, ideia estimulada pelos encontros já realizados entre as cátedras do Instituto.

Levantamento

No entanto, ao iniciar o trabalho de organização de um encontro, verificou-se que havia nisso um tema de pesquisa: "Ninguém sabia quantas e quais eram as cátedras existentes na universidade", afirmou Plonski. Dessa forma, surgiu um primeiro estudo sobre as principais características das cátedras da USP.

Paulo Almeida, pesquisador e analista administrativo do IEA, apresentou os resultados do trabalho. Foram identificadas 23 cátedras em atuação na Universidade. A pesquisa já foi respondida por 15 delas. O levantamento deve resultar em dois produtos: um catálogo e um artigo com uma análise mais detalhada do histórico das cátedras.

Quanto à periodização do surgimento das cátedras que já responderam à pesquisa, verificou-se que uma foi criada nos anos 90, três na década de 2000, sete na década de 2010 e nos três anos da década atual já foram instaladas quatro. A previsão de duração das cátedras concentra-se em torno de cinco anos.

Temas

Almeida disse que foram identificados seis grandes blocos temáticos:

  • arte, cultura e ciência
  • políticas públicas de educação
  • relações culturais e históricas
  • sustentabilidade
  • pesquisa e inovação
  • segurança e defesa

As motivações para as unidades e departamentos optarem pela cátedra como modelo de estruturação de posto de pesquisa são variadas. As principais são interdisciplinaridade; globalização e intercâmbio; respostas a desafios sociais; promoção da inovação, engajamento com a sociedade; flexibilidade e adaptação.

A governança das cátedras se dá por meio de comitês ou conselhos de governança, coordenação acadêmica e coordenação executiva. A preocupação com a multidisciplinaridade na escolha de seus participantes acompanha a busca por interação com a sociedade civil.

Outras características do funcionamento das cátedras são a flexibilidade e adaptação acadêmicas e administrativas, além da atenção à transparência e prestação de contas (questão relevante no caso do financiamento externo) e à integração tecnológica (uso regular de ferramentas digitais nas atividades).

A origem dos recursos também é diversificada, incluindo o orçamento da Universidade, governos externos e locais, agências de fomento nacionais e organizações do setor privado. Algumas cátedras não se beneficiam de financiamento externo ou de recursos de agências de fomento.

Roteiro

Marcovitch propõe esta série de perguntas como guia para a criação de uma cátedra - ou reestruturação de uma já existente:

  • Qual é o contexto no qual a cátedra está sendo concebida?
  • Qual é a missão da cátedra e seus objetivos?  Acelerar o avanço do conhecimento em determinada área, abrir novas áreas de investigação, aumentar o impacto social de uma área consolidada ou resolver um desafio crítico da sociedade?
  • Quem são os beneficiários com a realização dos objetivos e como se beneficiarão? Como as partes interessadas relevantes (stakeholders) serão engajadas no processo?
  • Quais são os resultados esperados e impactos almejados? Quais são as métricas e indicadores considerados?
  • Que planos estão sendo considerados para aumentar o impacto dos resultados?  Em quanto tempo os benefícios da cátedra poderão ser percebidos?  Como o impacto poderá ser demonstrado? Que evidências serão coletadas?
  • Quais são os critérios para atrair e motivar talentos que viabilizam a missão e objetivos em decorrência das suas contribuições diferenciadas, que afirmam sua singularidade nas esferas nacional e internacional?
  • Quais são os aportes decorrentes do financiamento da cátedra além da remuneração dos seus ocupantes? (Laboratórios, acesso a bolsas de estudo e/ou a capacidade de construir novas competências humanas e materiais.)
  • Como assegurar o valor real do financiamento da cátedra numa perspectiva de médio e longo prazos?
  • Qual será o modelo de governança da cátedra? (Legitimação, responsável, processos de planejamento, execução, avaliação e renovação das lideranças, um único conselho de até sete membros atentos às peculiaridades de suas atividades.)
  • Como criar uma estrutura para a disseminação das melhores práticas e experiências para aprimorar o desempenho acadêmico e a inserção internacional?

Financiamento

As cátedras com titulares os remuneram, em geral, com bolsa fixa, adicionais de diárias, verbas de pesquisa e potenciais gratificações. Essa remuneração provém de fundações ligadas ao setor bancário, outras entidades privadas, governos estrangeiros, agências acadêmicas e fundos de apoio sem fontes definidas. A pesquisa constatou uma tendência de diversificação dos financiadores e de crescimentos recursos, com aportes adicionais e prorrogações de cátedras.

Atualmente, o financiamento anual extraorçamentário varia de R$ 100 mil a R$ 300 mil. Em alguns casos, passa de R$ 500 mil e há uma exceção, no valor de mais de R$ 1 milhão.

As atividades das 15 cátedras já resultaram em 158 artigos de periódicos científicos, 72 livros, 58 capítulos de livros e 47 trabalhos de pós-graduação (teses e dissertações). A produção acadêmica também incluiu cursos, conferências, documentários, relatórios, resenhas, softwares e uma patente.

Indagados sobre as principais contribuições das cátedras, seus responsáveis citaram: visão multidisciplinar, diálogo entre saberes, participação em políticas públicas, internacionalização, sustentabilidade, formação e educação, promoção do conhecimento, direitos e legislação, meio ambiente, engajamento social e temas atuais.

As redes de colaboração das cátedras envolvem instituições diversas, não apenas universitárias. Há vínculos com projetos temáticos, formuladores de políticas públicas e redes de monitoramento e mapeamento. Em termos internacionais, dá-se mais ou menos o mesmo, envolvendo universidades, redes temáticas globais e centros de pesquisa.

A comunicação pública utiliza mídias diversificadas, sobretudo digitais. São realizadas conferências e seminários online, podcasts e produção de conteúdo para redes sociais.

Jacques Marcovitch, ex-diretor do IEA e ex-reitor da USP, conferencista do encontro, destacou a internacionalização como aspecto fundamental, com a prestação de informações sobre as cátedras brasileiras às universidades globais e obtenção de informações sobre cátedras existentes no exterior.

Vetores

Para ele, vistas sob um prisma que considera a universidade um sistema complexo, as cátedras devem ser analisadas a partir de seis vetores: entorno, insumos, processos, resultados, impactos e valores.

O entorno atual, afirmou, é marcado por transições simultâneas e um avanço da CT&I que aumenta a imprevisibilidade desta era. Ao mesmo tempo, "a universidade tem de produzir respostas a vários problemas estruturais, como é o caso da desigualdade na América Latina".

Marcovitch considera que há cinco transições em curso em busca de respostas:

  • A transição demográfica - que faz com que a saúde tenha de responder às elevadas taxas de mortalidade e ao mesmo prolongar a esperança de vida e proporcionar bem-estar coletivo;
  • A transição digital - como reduzir o fosso digital entre aqueles que têm acesso a redes confiáveis e a grande maioria que não tem acesso ou tem acesso precário e dispendioso;
  • A transição socioeconômica - como enfrentar a dualidade socioeconômica, que se agravou ainda mais após a crise sanitária da Covid19;
  • A transição ecológica - como conciliar a conservação da natureza e o equilíbrio climático com o bem-estar humano;
  • transição geopolítica - como enfrentar polarização que mobiliza recursos crescentes para conflitos armados entre Estados e no interior de Estados.

Jacques Marcovitch - Intercátedras
Jacques Marcovitch: ''A avaliação dos impactos é feita pelos usuários dos serviços prestados à sociedade''
Voltando aos vetores a serem considerados no caso da universidade pública, Marcovitch especificou que os insumos são a legislação externa, que determina a missão da instituição, e os recursos orçamentários. A vertente dos processos engloba o planejamento, a execução e a avaliação dos recursos humanos e financeiros.

Resultados

Os resultados (outra das vertentes) - incluem curadoria do conhecimento, o avanço da ciência, a formação de pessoas, publicações sobre as pesquisas, e atividades de extensão e iniciativas culturais, disse. Ele fez uma distinção entre resultados e impactos (outra das vertentes): "Impacto é a capacidade da comunidade acadêmica de construir conhecimento e formar pessoas que respondam aos anseios da sociedade por um aumento do bem-estar e sustentabilidade ambiental".

Se os resultados são avaliados pelos pares acadêmicos, nos casos dos impactos, a avaliação é feita pelos usuários dos serviços prestados à sociedade, afirmou. Daí a importância de a ação universitária estar alicerçada em valores acadêmicos voltados à promoção de princípios de liberdade, justiça, dignidade humana, pluralismo, solidariedade e probidade, acrescentou.

Na opinião de Marcovitch, para a concepção de uma cátedra ou adequação de uma existente é preciso ter uma definição clara sobre contexto, missão, objetivos, insumos, processos, resultados esperados, impactos almejados e valores praticados no momento da formulação do projeto.

Fotos: Fernanda Rezende/IEA-USP