Bons projetos nascem da escuta dos alunos
Pontos-chave |
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1. É impossível mobilizar os interesses do aluno sem investigar o contexto em que ele vive, suas preocupações e ações. Em crianças pequenas vale a observação atenta dos professores, no caso de adolescentes é importante que a escola se coloque como um espaço de diálogo e de troca de saberes. 2. Atividades que incentivam uma postura empreendedora nos alunos têm poder de fazê-los se sentirem corresponsáveis por seu aprendizado e se reconhecerem como sujeitos críticos, participantes e transformadores da sociedade. 3. Projetos que discutem comportamentos ou atuam para melhorar o ambiente físico fazem sentido para crianças e adolescentes e permitem que experimentem uma sensação de pertencimento ao grupo e à unidade escolar. |
Por Rodrigo Ratier e equipe
Valorizar o interesse, o histórico de vida, as preocupações dos alunos e o que eles estudam na escola ajuda a lidar com a diversidade e a promover a equidade? Que recursos podemos mobilizar para dar sentido à trajetória escolar deles? Estas foram as provocações lançadas pelo professor Lino de Macedo aos cerca participantes da atividade temática "Escola: Desenvolvimento de Interesses", durante o primeiro encontro do Ciclo A Escola: Espaços e Tempos das Ações Docentes, da Cátedra de Educação Básica da USP. A discussão entre educadores de redes públicas e particulares de várias regiões do Brasil, coordenada por Helena Singer e Claudia Petri, teve o objetivo de levantar questões que pudessem reverberar dentro das escolas e, ao mesmo tempo, dar oportunidades para professores e gestores da educação básica serem autores, criando propostas de atuação. “Sabendo o quanto a escola é importante, como podemos pensar em desenvolver o interesse do aluno, considerando a situação em que ele vive?”, perguntou a socióloga Helena Singer.
Os participantes, divididos em grupos de quatro a cinco pessoas, iniciaram a atividade discutindo impressões acerca da palestra "Escola, Diversidade e Equidade", apresentada pelo professor José Francisco Soares, e sobre diferentes estratégias para desenvolver o interesse dos alunos pela aprendizagem. Deviam relembrar exemplos para relacionar com o tema desigualdade e equidade, refletir sobre como trabalham esses conceitos no dia a dia e lidam com a inclusão.
Valorização dos saberes
Quando as coordenadoras abriram a roda de conversa para que os educadores apresentassem o conteúdo discutido, sobressaíram projetos que reconhecem histórias de vida e privilegiam o diálogo, como os do primeiro grupo:
- As professoras de uma escola municipal decidiram que era importante escutar os responsáveis e criaram o projeto “Famílias que ensinam” quando a lei mudou e as crianças passaram a entrar no Ensino Fundamental aos 6 anos.
- Com base em um aprendizado adquirido na escola, um estudante de EJA fundou um movimento de economia criativa, com banco e moeda própria, no bairro paulistano do Campo Limpo, que tem como objetivo viabilizar a produção artística da periferia.
- Durante uma pesquisa de preços no supermercado, atividade de educação financeira, uma aluna cega percebeu que havia pouquíssimos produtos com identificação em braille. Ela e seus colegas 4º ano resolveram escrever para a Nestlé, contando sobre seu direito tolhido, já que não poderia ler o rótulo de uma caixa de bombons. A empresa enviou caixas de bombons com impressão em Braile e contou que daquele momento em diante mudaria suas embalagens. O fato deu às crianças a certeza de que cobrar por seus direitos é legítimo e transformador.
O segundo grupo destacou a tarefa de uma coordenadora pedagógica de São Paulo, que repensou, junto com uma supervisora de ensino, o Projeto Político Pedagógico (PPP) de um CEI (Centro de Educação Infantil), uma EMEI (Escola Municipal de Educação Infantil) e uma EMEF (Escola Municipal de Ensino Fundamental). As três unidades escolares ocupam o mesmo quarteirão e não se conversavam. O desafio foi planejar espaços e tempos, em uma proposta que respeitasse o conceito de educação integral.
Quem é Claudia Petri |
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Pedagoga e Mestre em Educação: Formação de Formadores, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), atua com programas e projetos na área de formação da Fundação Itaú Social. Trabalhou na Secretaria Estadual de São Paulo como professora, coordenadora pedagógica e diretora escolar e foi coordenadora e gerente de projetos educacionais no Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec). |
Quem é Helena Singer |
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Doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo, com pós-doutorado pelo Laboratório de Estudos e Pesquisas sobre Ensino e Diversidade da Universidade Estadual de Campinas (LEPED-Unicamp). É vice-presidente Ashoka para a Juventude na América Latina. Foi assessora especial do Ministro da Educação (2015), diretora da Associação Cidade Escola Aprendiz e pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da USP. É autora livros e artigos sobre educação e direitos humanos. |
Nos projetos criados pelos grupos ficou evidente que se entende que crianças e jovens precisam empreender e que as atividades da escola precisam ser readequadas. “Eles trouxeram o conhecimento da prática e fizeram trocas enriquecedoras. Os projetos são muito possíveis em qualquer realidade escolar”, elogia Claudia. Na opinião de Helena, os participantes se preocupam em conhecer seus alunos, fazem uma sensibilização dentro do contexto do bairro e da cidade e propõem experiências de escuta, pesquisa e diagnóstico, para então trabalhar considerando os interesses de crianças e jovens.