A Institucionalidade da Cultura e as Mudanças Socioculturais
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Como titular da Cátedra Olavo Setubal de Arte, Cultura e Ciência desde setembro de 2020, Néstor García Canclini vem investigando processos de transformação da cultura e das comunicações contemporâneas, com especial atenção às relações e aos desacordos entre a desinstitucionalização do setor e as trajetórias dos movimentos independentes.
Para o catedrático, processos de desinstitucionalização remetem ao enfraquecimento de programas estatais, muitas vezes provocados por cortes no orçamento e privatizações. O autor também aborda o fenômeno que faz com que instituições (como museus, livrarias, cinemas, teatros, auditórios, espaços para eventos musicais e festivais populares) sejam parcialmente substituídas por aplicativos ou servidores digitais, os quais muitas vezes pertencem a empresas que modificam a distribuição e a circulação dos bens culturais, as formas de encontro e a sociabilidade.
Por outro lado, Canclini percebe a expansão de movimentos independentes, que buscam comunicar suas artes e culturas por meios tradicionais, midiáticos e eletrônicos, criando mercados alternativos e outras formas de interação com o público e os usuários. Esses movimentos geralmente são associados a novos modos de organização sociocultural, que algumas vezes se institucionalizam, criando vínculos multidirecionais com órgãos públicos, fundações privadas e universidades interessadas em maneiras inovadoras de produzir e transmitir conhecimento em rede.
De acordo com o antropólogo, ambos os processos – a desinstitucionalização da cultura e a emergência de movimentos independentes – estão ligados a um fenômeno mais amplo, que engloba a descidadanização da política partidária e a busca por diferentes formas de cidadania, entre elas: o exercício dos direitos humanos, as elaborações simbólicas, as práticas artísticas e a participação em decisões que afetam a vida comunitária, as cidades, as nações e as relações internacionais. Algumas iniciativas buscam renovar instituições tradicionais, outras geram resistências e alternativas de atuação, levando em conta interações culturais, presenciais e virtuais.
Ao lado dos pós-doutorandos Juan Brizuela e Sharine Machado, Canclini vem compilando experiências dos últimos anos, notadamente as condicionadas pelo neoliberalismo e pela pandemia de COVID-19. Dois projetos relacionados integram a pesquisa.
A investigação Fora de jogo? A dimensão territorial dos processos de institucionalização, desinstitucionalização e reinstitucionalização cultural na América Latina, conduzida por Juan Brizuela, trata da cultura pública efetivamente institucionalizada nas últimas décadas no Brasil, na Argentina e no México, a partir do programa Pontos de Cultura e do movimento Cultura Viva Comunitária, considerados paradigmáticos das políticas culturais latino-americanas contemporâneas.
Sharine Machado, por sua vez, conduz a pesquisa Poetas em tempos de penúria, abordando ações em rede, articuladas por artistas, profissionais da cultura e outros membros da sociedade civil brasileira, que resultam na elaboração e implementação de políticas públicas para o setor. Seu principal objeto de estudos é o processo de criação e aprovação da Lei de Emergência Aldir Blanc, em 2020, no Brasil (Lei nº 14.017/2020).
Para compartilhamento dos resultados, estão previstas publicações de cadernos de pesquisa, livro e site, além de encontros e debates virtuais.