O mundo não está preparado para uma nova pandemia, afirmam especialistas
Surtos como ebola, H1N1 e, principalmente, a Covid-19 revelaram a falta de preparo dos governos, sistemas de saúde e países no geral para lidar com esses vírus. “Houve um grande fracasso na resposta à pandemia da Covid-19 no plano mundial. O próprio diretor geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Dr. Tedros Adhanom, falou de um fracasso moral da comunidade internacional”, afirmou Deisy Ventura, uma das conferencistas do evento “E se a Pandemia Acontecesse Hoje? O Mundo Está Mais Preparado do que Há Cinco Anos?”, realizado dia 11 de março no IEA, data em que a OMS declarou a pandemia mundial.
- O encontro marcou o lançamento do ciclo “Resiliência Global: Estratégias para a Próxima Pandemia” / Foto: Joana Thomaz | IEA
No encontro, especialistas discutiram os acordos e negociações realizados na pandemia, os avanços da OMS e as emendas ao Regulamento Sanitário Internacional (RSI).
Professora titular da Faculdade de Saúde Pública da USP (FSP-USP) e vice-diretora do Instituto de Relações Internacionais (IRI-USP), Deisy apresentou dois processos em curso liderados pela OMS com foco no enfrentamento de novas pandemias: a atualização do RSI, adotada em maio de 2024 e em fase de implementação; e o acordo mundial sobre pandemias, postergado para maio de 2025 por falta de consenso entre os governos.
Ela explicou que as emendas no RSI instituem a nova categoria “emergência pandêmica”, com restrição para doenças transmissíveis de alto risco. Essa categoria melhora o processo de identificação de uma pandemia, que, segundo a professora, foi ambíguo no Covid. O regulamento também aumentou o papel da OMS, principalmente na garantia do acesso equitativo aos produtos de saúde adequados.
Apesar desses avanços nos tratados, as especialistas afirmaram que o mundo não está preparado para uma nova pandemia. “No caso do Brasil, especificamente, nenhuma dúvida que a resposta é negativa”, declarou Deisy. A pesquisadora explicou que a lei 13.979 de 2020 foi criada exclusivamente para o controle da Covid-19, ou seja, o Brasil atualmente não tem uma legislação para lidar com uma futura pandemia.
“Precisamos fazer um balanço no Brasil de quais foram os nossos principais erros e, dentro dos nossos acertos, ver o que podemos tirar para ter uma política de Estado de resposta a emergências. Uma política que seja perene, que não dependa de um governo e que seja traduzida na legislação”, explicou.
Veja também |
---|
Denise Cardo, também conferencista, apontou a importância da comunicação e integração entre os laboratórios, serviços de saúde pública, setores e comunidades para melhorar e dinamizar as respostas às pandemias. “Precisamos de uma mudança cultural, com transparência, acesso à informação, confiança e foco nas pessoas.”
Consultora executiva e ex-líder sênior do Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC), Denise apresentou diferentes ferramentas para melhorar o planejamento e resposta a doenças infecciosas, como os indicadores “7-1-7” da organização Resolve to Save Lives. O conceito é baseado na estratégia de sete dias para detectar, um para notificar e mais sete para desenvolver uma resposta inicial. “Às vezes o que você tem que melhorar não é uma tecnologia incrível, mas uma maneira diferente de pensar e agir”, explicou.
Ela também defendeu a necessidade de envolver as universidades, escolas e líderes das comunidades no processo de criação de políticas de respostas. Denise explicou que essa relação desenvolve a confiança da população, o que contribui para a comunicação multisetorial e maior aderência das políticas. “A confiança é o mais importante. Comecem agora, com foco em quem é nosso costumer [cliente], estamos fazendo tudo isso para que as pessoas não morram.”
Organizado pelo IEA e pela Faculdade de Medicina da USP (FM-USP), o encontro marcou o lançamento do ciclo “Resiliência Global: Estratégias para a Próxima Pandemia” e está disponível na íntegra no canal do Youtube do IEA. Clique aqui para assistir o evento completo.